domingo, 4 de maio de 2008

Paulo Vinícius Coelho - Fama, timidez, futebol e Cid Moreira


Entrevistar Paulo Vinícius Coelho, mais conhecido como PVC, um dos grandes nomes do jornalismo esportivo na atualidade, fez com que eu me questionasse: será verdade que todo brasileiro entende um pouco de futebol? Afinal, se isso é verdade, qual motivo leva tantos admiradores do esporte a considerarem PVC um dos mais credenciados a falar sobre o assunto? Essa era uma das minhas dúvidas, e entrevistá-lo seria uma ótima oportunidade para entender isso.

O dia era 29 de agosto de 2007, eu havia chegado à ESPN Brasil (canal de TV especializado em esportes) por volta das 9h30. Depois de ter me apresentado na recepção, aguardei cerca de 20 minutos até que a recepcionista conseguisse falar com o próprio (que estava na redação), para informá-lo que eu o esperava. Fui orientado a aguardá-lo na cafeteria. Quando começava a preparar meu gravador, escuto passos acelerados em minha direção, era o meu entrevistado.

Um rápido cumprimento enquanto tomava um copo de café, fez com que eu percebesse que Paulo faz as coisas em ritmo muito rápido. Durante a conversa fui surpreendido por um fato que faria com que aquele dia fosse especial, obviamente não pela minha presença, mas sim por se tratar do aniversário do meu perfilado, e por conta disso a gravação foi interrompida para que ele recebesse os abraços dos colegas.

Após os cumprimentos (de uma série que certamente se estenderiam durante todo o dia na redação), PVC confidenciou-me algo. Eu não era o único que queria realizar um perfil sobre ele; além de mim, João Moreira Salles, um dos maiores documentaristas da atualidade, estava interessado em realizar um perfil do jornalista para a revista PIAUÍ.

Paulo demonstrou bastante surpresa com essa possibilidade e, talvez por isso, um tema tenha surgido: Qual a função do jornalista? Eu nem sequer podia imaginar que essa seria uma das questões centrais da entrevista. Com o decorrer da conversa, a preocupação em nunca perder o foco de qual é o seu papel dentro do jornalismo se tornou visível, algo que foi colocado à prova cinco dias depois.

Cid Moreira

Em 4 de setembro, nosso segundo dia de entrevista, PVC recebeu uma correspondência em formato de caixa; nela um gravador e uma mensagem na voz de Cid Moreira. A gravação informava que Paulo estava classificado para o Prêmio Comunique-se 2007, categoria melhor jornalista de esportes, ao lado de outros dois colegas de profissão.

A sua reação à notícia foi um misto de normalidade e bom humor, inclusive brincando com a possibilidade de não ir à premiação, pelo fato de nos dois anos anteriores ter perdido o prêmio. Quando o pessoal da redação pediu para ouvir a mensagem novamente, ele ligou o gravador, mas não parou de trabalhar enquanto os colegas lhe davam os parabéns pela indicação e se divertiam com a voz emblemática de Cid Moreira.

Essa atitude veio ao encontro do discurso que o jornalista prega com bastante veemência: “O jornalista não é a notícia”. Em diversos momentos, PVC pontuava que o jornalista não pode se esquecer que só existe por causa da notícia e afirmava a necessidade do profissional saber que mesmo sendo uma pessoa pública, ele não é importante e sim o entrevistado.

Paulo encara o jornalismo esportivo com seriedade e crítica o “jornalismo espetáculo” praticado, “principalmente, pela televisão”. O jornalista considera inadmissível conciliar informação com publicidade e acha que a relação com a fonte precisa ser muito cuidadosa. “Você precisa sempre se avaliar para saber se você está certo ou errado.”

PVC trabalha em televisão e jornal, e sua rotina é relativamente tranqüila. O jornalista chega às 8h na ESPN Brasil – onde acumula os cargos de comentarista e chefe de reportagem -, passa para a redação o que tem no dia, prepara a pauta do dia seguinte e se concentra no programa Bate Bola. Costuma usar o período da tarde para escrever sua coluna para o jornal de esportes o Lance!

Sua rotina permite que busque os filhos na escola e almoce em casa, graças ao fato de morar a apenas 10 minutos – de carro – da TV. Além do trabalho, o jornalista divide seu tempo com a família (PVC é casado e tem dois filhos).

A decisão de estudar jornalismo aconteceu de uma forma peculiar. Aos 16 anos, durante uma conversa com a mãe – dia em que França e Bélgica disputavam o terceiro e quarto lugares na Copa do Mundo do México, 1986 -, Paulo decidiu que faria jornalismo. Mesmo com o alerta do pai em relação à baixa remuneração da profissão, a vontade tornar-se jornalista falou mais alto.

PVC conta que sua relação com o futebol começou muito cedo, aos 10 anos, lendo o caderno de esportes do Jornal da Tarde e a revista Placar. “Aprendi a ler (jornal), lendo futebol e isso interferiu na minha decisão.”

Lições para toda a vida

Além do aspecto financeiro, outro fator preocupava o pai do jornalista: a timidez do filho. PVC afirma que quando decidiu seguir uma profissão, sabia que independentemente de qual fosse, iria lidar com algum tipo de dificuldade. Seu primeiro desafio: aprender a falar em público. A estratégia escolhida foi começar a se expor em apresentações de trabalho em grupo na época da escola, tarefa antes rejeitada. Isso o ajudou bastante.

O jornalista continua tímido, pude ver isso no primeiro dia de entrevista. Fomos a uma padaria e em alguns momentos o silêncio predominava, quebrado apenas por minhas perguntas. No segundo dia de conversa fui convidado a acompanhá-lo até sua casa durante o horário de almoço. Em meio a garfadas, dividia a sua atenção com um programa de esportes, no qual o assunto discutido não poderia ser outro, futebol.

Um outro fator marcante na época de escola diz respeito aos seus professores de redação. O jornalista revela que durante a adolescência já escrevia bem, porém, seu texto nunca foi criativo. “A lembrança que eu guardo da adolescência, com 12 e 13 anos, é que eu não gostava das aulas de redação, porque sabia que tinha que escrever algo que seria lido na frente, uma coisa que me incomodava porque era tímido e que como não produzia nenhum tipo de elogio, me deixava frustrado.”

Paulo acredita que se os professores trabalhassem o perfil da cada um dos alunos, os estudantes não perderiam o prazer de escrever. “Minha profissão é escrever, eu poderia ter me convencido de que eu não sabia escrever”.

Quando decidiu entrar na Faculdade, fatores como a proximidade com a sua casa – PVC morava em São Bernardo – e o conceito da Universidade pesaram na sua decisão, entretanto, a escolha não se limitou a isso. “Eu me lembro da época em que procurava emprego de office-boy, eu ficava olhando, procurando o prédio da Metodista, até que um dia avistei o símbolo da faculdade, eu queria estudar ali”.

PVC diz que a entrada na Universidade lhe trouxe amadurecimento, porém, nunca esperou que a faculdade fosse transformar sua vida. “Eu não tinha essa expectativa e por isso a entrada na faculdade não me causou nenhum tipo de frustração, quem teve essa expectativa repetia um discurso no qual eu não acreditava, que a faculdade era um lixo e que não se aprendia nada; para mim era o local onde eu ia aprender coisas importantes para a minha carreira, o caminho para o mercado de trabalho, por isso tive uma passagem tranqüila”.

Mas como na vida de qualquer pessoa que opta por uma profissão e depois enfrenta o desafio de construir uma carreira profissional, as incertezas são constantes. “O receio sempre existe, primeiro você têm medo de não entrar na faculdade, depois o de não entrar no mercado de trabalho e por último o receio de sair do mercado de trabalho, esse é um receio que vai durar a vida inteira, de maneiras diferentes”.No início o jornalista trabalhou em jornais semanais de São Bernardo do Campo em diferentes editorias, o que considera importante no seu aprimoramento como repórter, pois teve bastante contato com redação.

No Diário do Grande ABC, atuou na editoria Geral, cobrindo a cidade de Diadema. Sua primeira obrigação era produzir matérias sobre temas policiais, algo que Paulo odiava. Essa experiência foi um sinal para dedicar-se ao futebol.Contrato não renovado com a publicação, o jornalista fez o curso Abril, ingressando depois como estagiário na revista Ação (considerada a irmã mais nova da revista Placar).

Após ter trabalhado na Ação, Paulo foi para a Placar. “Era tudo o que eu queria, eu tive uma sorte muito grande, eu lia a revista desde os 10 anos, comecei a trabalhar lá aos 21 e fiquei até os 27, meu texto combinava com o da revista, pois era leitor desde cedo”.

Mesmo trabalhando em um ambiente com o qual se identificava, em 1995, o jornalista atravessou período difícil por conta de uma mudança na linha editorial da revista e a contratação de outros profissionais. “Foi um momento infeliz pois foi montada uma nova redação e todos que chegaram foram muito valorizados e quem já estava lá não”. Nessa época, Paulo pensou em sair, mas acabou resignado a continuar devido à falta de propostas.

No lugar certo e na hora certa

Em 1997, PVC se sentia feliz e acostumado à nova revista, até que uma “nota” de jornal mudaria seus planos. Um novo jornal especializado em esportes, inspirado no jornal argentino OLÉ. Ligou para um colega com quem havia trabalhado na revista Ação, perguntando se sabia de algo. Para sua sorte, ele fazia parte do projeto, era o jornal Lance!

Paulo foi convidado a trabalhar na nova publicação, mas recusou. “O convite era legal, mas era menos de 20% de salário, não valia a pena”. O jornalista considera a recusa inicial uma das melhores coisas que já fez, pois 15 dias depois recebeu um novo convite. “Me ligaram perguntando o que eu queria para ir pra lá e aí eu fui como repórter especial e colunista”.

Trabalhar no jornal de esportes foi algo que transformou muito a sua vida. “Eu passei a fazer jornal, a participar mais e o meu trabalho a aparecer mais”. A experiência do Lance! trouxe o reconhecimento que o jornalista almejava desde a época da escola, quando lia suas redações para os colegas. Essa visibilidade o levou, dois anos mais tarde, a trabalhar na ESPN Brasil.

Conciliando conhecimento futebolístico e uma certa timidez, Paulo segue como uma das referências no jornalismo esportivo. Quanto a minha dúvida inicial, se todo brasileiro entende de futebol, cheguei à conclusão que a maioria até entende um pouco, porém, pouquíssimos são como PVC, “viciados” no assunto.

A batalha das revistas musicais

Como diria Arnaldo Antunes, música é feita para ouvir no trabalho, para jogar baralho e para arrastar corrente, entre outras coisas, porém, parece que música não é lugar para estar na revista, pelo menos essa é a constatação que tive ao entrevistar algumas pessoas ligadas a diferentes revistas de música no Brasil.

Enquanto alguns ainda mantêm certo otimismo com relação às revistas brasileiras de música, outros são extremamente descrentes da continuidade dessas publicações. “A internet ocupou todo o espaço, o público que ia a banca para comprar revistas de música, encontra essas e outras informações na internet”, essa constatação cética com relação às publicações musicais foi dada por Maurício Kubrusly, atual repórter do Fantástico, da rede globo, que durante 10 anos dirigiu a revista de música Somtrês, uma das mais significativas revistas brasileira de música.


A última edição da revista foi publicada em 1989 – época em que a internet não amedrontava a continuidade das revistas -, em uma edição comemorativa de 10 anos. Kubrusly afirma que o fim da revista não teve nenhuma relação com a vendagem da revista. “Eu estava trabalhando em 4 lugares, na Editora 3, TV Cultura, TV Globo e recebi um convite para fazer rádio....eu tinha muito tesão em fazer rádio e quando abriu a possibilidade de fazer, eu avisei a direção da Editora 3 que eu iria sair por que eu queria fazer rádio e rádio tomava muito tempo. O dono da editora disse que se eu saísse ele fecharia a revista, eu não achei legal isso, ele colocar essa responsabilidade na minha mão, a responsabilidade pelas pessoas perderem o emprego, mas eu decidi sair, pois a vida é minha e eu só tenho uma”.

Maurício afirma que nos últimos anos a Somtrês não tinha mais o mesmo impacto devido às mudanças no mercado publicitário. “Eu não sei se ela iria continuar, se eu tivesse continuado lá”.

Além de Kubrusly, outras pessoas ligadas a revistas de música também são pessimistas quanto ao futuro dessas publicações. É o caso de Dado Abreu, editor da revista da MTV há 1 ano e meio. “Revista hoje vende muito pouco, com a mídia eletrônica a revista ficou muito enfraquecida, então acaba vendendo as mesmas revistas de sempre, como as revistas de fofoca e a Veja, só essas revistas vendem”.

Dado acredita que não são só as revistas de música que passam por dificuldade, e sim a música. “O disco não vende mais, o show não é da mesma maneira.....vender música se tornou difícil. A revista é só mais uma mídia que poderia ser utilizada para música, mas que não consegue mais ter o seu espaço”.

Depois de 5 anos - três dele restrito aos assinantes – a revista da MTV encerrará suas atividades em dezembro. O editor diz desconhecer os motivos do fim da revista, mas afirma que não houve uma grande queda nas vendas. “Nos últimos 3 anos a gente teve uma média legal, a gente conseguiu sobreviver de uma maneira legal..... para orçamento de 2008 a direção pensou que fosse melhor acabar, mas nada que a gente tenha dado uma grande queda do ano passado para esse.

Apesar da descrença, Abreu acha que uma boa saída é trabalhar com um público específico. “Você trabalha com um número certo de leitores, não precisa pensar muito grande e falar que vai fazer uma revista para 100 mil. Ter uma tiragem pequena, um custo pequeno, um gasto pequeno, uma sobra muito pequena......trabalhar com um orçamento reduzido e fazer uma revista para um público certo.... aí você não perde nada com isso.

Além de Dado, o Editor da revista de metal Roadie Crew, Airton Diniz, diz que trabalhar com público segmentado é o motivo de sucesso de sua publicação. “O fato de ser segmentada é o que sustenta a base de leitores fiéis. Se fosse uma revista genérica que tentasse atingir todo e qualquer tipo de público, com certeza não teria muito sucesso, muito tempo de mercado”.

Diniz acredita que quanto mais segmentada, mais fácil é atender um público que tem um interesse específico e, vai além. “Revista de música é o tipo de negócio que na medida em que você tenta ser o mais abrangente possível você acaba perdendo o seu público”. Atualmente a Roadie Crew têm uma tiragem de 40 mil exemplares.

Airton conta que além de se manter fiel a linha editorial adotada desde o início da publicação, outro motivo de longevidade da revista é a participação dos anunciantes. “No caso da revista de música com circulação em banca, o custo aproximado da publicação é meio a meio. Uma parte da receita vem da venda em banca, outra parte da publicidade, é claro que isso depende da política de cada empresa, mas com certeza é indispensável você contar com a receita vindo da publicidade”. Dado, da MTV, concorda com a opinião de Diniz. “É fundamental para qualquer revista ter anunciante, se você não tem anunciante você não tem revista, não adianta.. No nosso caso, esse problema a gente nunca teve, talvez por isso a gente tenha conseguido sobreviver durante tanto tempo com uma mídia que a cada dia mais é mais fraca. A gente conseguiu sobreviver bastante tempo, talvez por carregar a marca MTV, que junto com ela traz muitos anunciantes”.

O editor da Roadie Crew acha que revistas como a BIZZ e a MTV não deram certo devido a falta de identidade com o público. “Não adianta você fazer uma revista onde você coloque uma matéria de capa com alguém da MPB e, na mesma revista você colocar uma matéria extensa sobre um astro do Rock. Eventualmente, aquele que é fã desse astro de Rock, se ele for muito fã mesmo, ele vai comprar aquela revista, mas ele sabe que muito possivelmente vai ter uma publicação específica onde ele vai encontrar essa banda que ele gosta e algumas do mesmo segmento”.

Mesmo com o fim anunciado da revista, Dado Abreu acha que possuir uma marca forte é fundamental para uma revista dar certo. “Nós somos uma revista de marca, nós temos uma marca muito forte e um público muito grande ligado a essa marca. Então, a gente tem onde mexer, tem onde buscar o leitor, onde buscar o assinante. A gente tem o caso da Rolling Stone, que vem sobrevivendo bem e têm uma marca gigantesca. Ter uma marca por trás é fundamental para você sobreviver com uma revista de música”.

Procurado pela reportagem, Ricardo Cruz, editor chefe da revista Rolling Stone, não quis se pronunciar sobre o motivo das revistas de música não darem certo no Brasil, porém, o que chamou a atenção, foi sua explicação para a recusa. “A Rolling Stone não é uma revista de música, é também de música, por isso acho que não tem motivo para eu falar sobre esse assunto”.

Incrédulo em relação ao futuro da música e, conseqüentemente ao das revistas, Dado espera ver uma saída. “Eu quero ver o dia que a indústria fonográfica vai encontrar uma saída, saída essa que eu não consigo ver... quem sabe nesse dia, as revistas de música consigam sobreviver”. Resta saber quando será esse dia.